«Gostaria de ser recordado como o escritor que criou a personagem do cão das lágrimas (Ensaio sobre a Cegueira). É um dos momentos mais belos que fiz até hoje enquanto escritor. Se no futuro puder ser recordado como "aquele tipo que fez aquela coisa do cão que bebeu as lágrimas da mulher", ficarei contente. Se alguém procurar naquilo que eu tenho escrito uma certa mensagem, atrevo-me pela primeira vez a dizer que essa mensagem está aí. A compaixão dessa mulher que tenta salvar o grupo em que está o seu marido é equivalente à compaixão daquele cão que se aproxima de um ser humano em desespero e que, não podendo fazer mais nada, lhe bebe as lágrimas.»
«Deus uma volta, deu outra, já não reconhece nem as ruas nem os nomes delas, então, desesperada, deixou-se cair no chão sujíssimo, empapado de lama negra, e, vazia de forças, de todas as forças, desatou a chorar. Os cães rodearam-na, farejaram os sacos, mas sem convicção, como se já lhes tivesse passado a hora de comer, um deles lambe-lhe a cara, talvez desde pequeno tenha sido habituado a enxugar prantos. A mulher toca-lhe na cabeça, passa-lhe a mão pelo lombo encharcado, e o resto das lágrimas chora-as abraçada a ele.» (pág. 226)
Incredulamente, adorei o final. Superou todas as minhas expectativas. Logo eu que raramente gosto da forma como os livros acabam.
Foi direitinho para o 2º lugar da minha lista de livros favoritos. Ainda estou a digerir cada página... Ainda estou a tentar encontrar palavras para o adjectivar. Provavelmente não as há.
«O silêncio ainda é o melhor aplauso.» (pág. 292)
Zuza, com um olho no ecrã e outro na almofada.