quarta-feira, 12 de março de 2008

Importância da Leitura (finalmente)


A mini-biblioteca lá de casa é o meu Mundo. É uma divisão como todas as outras: um pequeno sofá encostado à parede, um tapete que cobre grande parte do soalho, uma janela que me permite voar e viajar aos pequenos Mundos que ganham pó naquela estante. Não vos falei da estante? A estante lá de casa é o meu passaporte de viagem. A bagagem é dispensável e o pagamento inexistente. Preciso apenas de três coisas: de mim, da minha imaginação e dos livros. Não vos falei dos livros? Falei sim, são os pequenos Mundos que ganham pó naquela estante.

Todas as tardes, depois de um dia de aulas, largo a mochila no chão do quarto e desço as escadas euforicamente em direcção ao meu Mundo. Nos dias mais frios, os de Inverno, sento-me no sofá acastanhado e já habituado a mim. Já nos dias quentes, os de Verão, abro a janela e acomodo-me no chão de pedra da varanda, aquecido pelo sol ao longo do dia, como se estivesse à minha espera.

Hoje é um dia de Verão. Dirijo-me à estante, percorro-a calmamente com os meus olhos e finalmente páro: é Aquele! Meio avermelhado, de lombada fina; uma viagem curta mas de longa distância. Inspiro o máximo que os meus pulmões me permitem; fecho os olhos, liberto o ar de uma vez só. O pó dança num compasso já ensaiado…

Como que por magia não estou na minha varanda. Estou num lugar desconhecido e bizarro. As pessoas não são pessoas, são letras. As famílias de pessoas não são famílias de pessoas, são famílias de letras, as chamadas palavras. O Mundo das pessoas não é o Mundo das pessoas, é o Mundo das palavras. Ou melhor, é o Mundo das pessoas e das palavras, porque sem pessoas não existem palavras e dificilmente existem pessoas sem palavras. São dois Mundos intimamente ligados; arrisco-me a afirmar que são inseparáveis. Nós possuímos as cordas vocais, a língua, a mente, as mãos. Possuímos as palavras. E não há nada melhor que um livro para tirarmos partido delas.

Um livro é mais do que um conjunto de folhas numeradas, é um ensinamento, um produto da cultura, um pedaço do nosso Mundo; e ler um livro não é apenas passar páginas, é uma completa lição de crescimento. Se hoje utilizo determinada palavra nos meus textos é porque ontem a li algures numa frase e me acostumei à sua grafia, ao seu som e, especialmente, ao seu significado. Conhecer uma palavra não é apenas decorar as suas letras, é inútil se não soubermos o que significa pois isto implica que não saibamos o momento oportuno para a utilizarmos. Um livro ensina-nos tudo isso. Oferece-nos uma palavra, inserida num determinado contexto a partir do qual poderemos conhecer a chamada face abstracta da palavra, ou seja, o seu significado, que nos permitirá saber onde e quando utilizá-la. É verdade que nem tudo se expressa por palavras, mas é também verdade que quanto maior for o nosso conhecimento maior será a capacidade de nos exprimirmos assim como a capacidade de compreender os outros e, consequentemente, a intenção com que nos dirigem determinadas palavras. Facilita, e muito, a comunicação entre as pessoas, algo essencial a todos.

Continuo a vaguear pelo meu livro de lombada fina e capa avermelhada. Viajo e viajo e percorro todo o Mundo. Conheço culturas diferentes da minha e formas de estar perante o Mundo que a mim nada dizem; aliás, não eram de todo do meu conhecimento. Com apenas três páginas atravesso o oceano atlântico, com uma percorro a América seguindo com três parágrafos para África.

Acabou. A magia desapareceu, o livro chegou ao fim e com um ponto final volto à minha varanda, ainda a tempo de observar o pôr-do-sol de uma bela tarde de Verão. Guardo o livro de lombada fina e capa avermelhada no mesmo sítio em que o encontrei. Inspiro e expiro vagarosamente, e com um último suspiro fecho a porta soltando somente um até amanhã (à mesma hora).

Zuza, uuh

1 comentário:

Tiago Ramos disse...

Muito bem, Zuza. Parabéns! É mesmo caso para dizer: "Uuuh"!